A palavra-alma, palavra que move, carrega experiência, sentido e significado, só pode existir se houver escuta. Num mundo ensurdecido pela pressa e pelo excesso de informação, a escuta torna-se espécie em extinção. Tal como o processo acelerado de destruição da vida que vemos acontecer na Amazônia, a magia da conversa, do diálogo e da transmissão vem se perdendo pela aceleração imposta pelo "sistema". Essa viagem de Naiara Bertoli, na qual ela se transforma num corpo-escuta, é um convite a questionarmos essa pressa massacrante e alienante. Através dos seus encontros com as mulheres indígenas do rio Negro, revelam-se histórias de luta, fé, amor, cuidado, resistência e resiliência para sobreviver ao processo cíclico de violência colonial. Reinventando-se com alegria genuína e amorosidade, essas mulheres nos ensinam a identificar o mundo apressado que impede o vínculo, que impossibilita a escuta, nos transformando nessa "sociedade do cansaço", como reflete o filósofo contemporâneo Byung-Chul Han. "Num país onde as palavras parecem não mais dizer. Se elas restavam esquecidas diante da falta de ouvintes, como poderiam criar vínculos entre o que foi e o que viria?", pergunta a autora. As narrativas das mulheres indígenas em suas paisagens cheias de significado e imaginação nos dão a oportunidade de mergulhar num universo sensível e diverso que sobrevive ao avanço da mercantilização da vida e da homogeneização do pensamento. A transmissão em palavras escritas dessas histórias só foi possível graças ao ouvido atento e sensível do corpo-escuta que se colocou em movimento para ir ao encontro pleno da experiência. Juliana Radler
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