Nunca descobri a verdade escondida naquelas palavras preciosas.
O meu pai é um velho que já mal me reconhece. Por vezes olha-me como se me visse pela primeira vez e abraça-me com uma saudade repetida que me fez indiferente. Outras vezes olha-me e não sabe quem tem na sua frente. Imobiliza-se na inteligência que sempre lhe reconheci. Eu sei que ele não me reconhece. Ele sabe que não se reconhece a si próprio. Imobiliza-se na certeza de que o universo mudou de lugar e esqueceu-se de o avisar.
Desço até à terceira rua de mortos empilhados num monte com vista para o Tejo (que bela vista se tem depois de morto). Fico uma hora mais em frente da campa do desconhecido que mandou gravar na pedra as palavras que têm de ser minhas:
Não Levo Saudade
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M.L. é um homem atormentado pelo passado e pelas palavras gravadas na pedra tumular de um homem enterrado no Cemitério dos Prazeres: Gervásio, que combateu nas Ardenas e viveu os últimos cinquenta anos abandonado pela família num rés-do-chão de um prédio que já caiu na Penha de França.
- Pai, o que me aconteceu em 1946?
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