O objetivo de Por que o divã? não é apenas o de nos despertar para a pletora de sentidos embutida na mobília mais característica dos consultórios de psicanálise, mas o de nos sensibilizar para a especificidade do próprio fazer psicanalítico, adotando o divã como sua metáfora maior. Lucas Krüger dividiu seu livro em duas partes bem distintas: a primeira, "Perspectivas da escuta", dedicada a uma extensa e invejável pesquisa, à moda acadêmica, acerca do estatuto do divã na obra de diversos psicanalistas. Já na segunda parte, "A poética da psicanálise", Krüger parece escrever como se suas palavras fossem a chuva fina que nos alivia, anunciando o fim da fúria de uma tempestade; trata-se de uma escritura de quem decerto frequentou seu "estado de nuvem" teorizante e foi capaz de transmitir, de modo elaborado e estimulante, o que de lá enxergou e intuiu. Metáforas são antídotos para o dogmatismo esterilizante. A metáfora conceitual "estado de nuvem" proposta por Krüger é o testemunho, em nome próprio, acerca do cerne da experiência psicanalítica, definido como escuta e poética. Escuta dos núcleos traumáticos do analisando, bem como de seu desejo de encontro com o Outro vitalizante, enunciados por modos de expressão diversos, seja pela palavra, seja pelo silêncio ou pelo brincar. Escuta, por parte do analista, do modo como é afetado no exercício do seu ofício. Poética como a criação possível, por meio do encontro afetivo, capaz de afetar ambos os parceiros dessa aventura chamada psicanálise. O divã fabricado por Lucas Krüger nos remete ao "estado de nuvem", oferecendo-se como verdadeiro antídoto à tendência de se criarem divãs de Procusto nos diversos lugares de transmissão da psicanálise. Daniel Kupermann
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